As mudanças promovidas pelo Covid-19 ainda são incertas. Não se sabe, com precisão, como o mundo se estruturara após a crise, mas pode-se afirmar que trará alterações profundas nos mais diversos pilares da sociedade, incluindo: empresarial, social, político, econômico, comportamental entre tantos outros. A maneira com que o Estado resolve os problemas comuns da população será aprimorada, ao mesmo tempo em que tenta equacionar as questões mais imediatas, enquanto a crise perdurar. A pandemia, com o enorme sofrimento que tem causado em âmbito global, impôs a necessidade de repensar a interação dos governos com a sociedade na construção de políticas públicas que possam melhorar a qualidade de vida das pessoas.
O combate à crise tem exigido o máximo que o arcabouço institucional do poder público pode oferecer como organizador da sociedade e direcionador das soluções comuns, em áreas essenciais como educação, segurança e saúde. Em crises passadas, setores específicos da administração tiveram o protagonismo em equacionar as respostas do governo, como crises econômicas ou produtivas. Em nenhum outro momento nas últimas décadas, ou talvez no último século, o setor público, como um todo, foi tão impactado. Não se trata mais de um tema apenas para a pasta econômica ou da saúde, mas dos direitos humanos, da ciência e todos os demais.
Um aspecto fundamental da transformação do papel do Estado será o uso de evidências ou das melhores informações disponíveis para elaborar políticas públicas que se antecipem aos problemas. Análise de tendências, com base na massa de dados disponível, otimização de recursos com foco no benefício gerado para o cidadão, análise e melhoria de exemplos e melhores práticas, tudo isso será indispensável para a obtenção de diagnósticos mais precisos que, por sua vez, poderão gerar melhores soluções.
Outro ponto importante de transformação será o componente da legitimidade das decisões públicas. Serão menos frequentes as vezes em que um dirigente público ou parlamentar apresentará políticas públicas sem engajamento com os lados envolvidos nessas políticas públicas, tanto sociedade civil quanto empresarial, não apenas um deles. A confiança pública só aumentará com a percepção de que as soluções oferecidas pelos governos atendem aos interesses da maioria, de forma justa, com menores margens para manobras eleitoreiras. A imprensa e seus editores desempenharão um papel mais importante do que nunca nesse novo modelo, porque trarão análises consistentes dessas novas políticas públicas e de seus resultados efetivos, e farão a seleção dos temas relevantes e de impacto, mas pouco salientes, e que precisam ser apresentados à opinião pública.
A gestão pública tem boa capacidade técnica de execução e cumprimento de normas estabelecidas, mas, depois da crise, terá de ir além. Haverá um avanço da atenção de outputs para os outcomes, ou seja, do que é feito e entregue para os efeitos e impactos que essas entregas efetivamente geram. É inegável que tem havido um descasamento entre o que se faz e o efeito esperado dessas ações. Gestores se questionarão crescentemente se faz sentido executar políticas públicas mal desenhadas e pouco embasadas, se basta apenas entregar serviços públicos desprovidos da crença no interesse comum. Um novo paradigma administrativo que possa gerar mais valor público emergirá dessa crise. O mundo pós Covid-19 nunca mais será o mesmo.